Para quem já não se lembra de mim, servia na messe dos oficiais, com o meu amigo Américo, também ex-Soldado Rec. Info., além de outros.
Aqui, vou contar um «episódio dramático», da minha forçada estadia durante 23 meses em Piche, que ficou gravado na minha memória, e enquanto viver, não o esquecerei, tal a brutalidade do acidente e do drama humano que se segui.
O acidente ocorreu quando eu estava de serviço de sentinela do lado da bolanha, no dia 21 de Julho de 1969.
Num momento, virei-me para o lado da bolanha e vi alguém aproximar-se do lado de dentro do arame farpado, que servia de vedação ao Aquartelamento e, de repente, sem que eu pudesse perguntar-lhe porque razão ele passava ali, já tinha saltado a primeira fiada de arame farpado e, foi no momento que ele percorria o espaço que separava a primeira da segunda fiada de arame farpado, que provocou uma enorme explosão, nesse instante, já eu ia nessa direcção, mas, ainda estava um pouco distante.
Imediatamente, fui a correr para o local para ver quem era e para lhe prestar socorro.
Quando cheguei ao local, nem queria acreditar naquilo que os meus olhos estavam a ver, tratava-se do Loureiro ex-Fur Mil (vaguemestre); encontrava-se com o corpo da cintura para cima no chão e o que restava das suas pernas, enroladas no arame farpado; tentei desenrolar as peles que restavam das suas pernas, para evitar que não sofresse tanto, atendendo à posiçãO em que ficou, o que consegui.
Como ele viu que eu estava com uma G3, a arma de serviço, não dizia outras palavras senão estas:«Pereira, tens uma arma mata-me. Dá-me um tiro na cabeça porque eu não quero continuar a viver sem as minhas pernas ».
Entretanto, começou a chegar mais gente, e começamos a levantá-lo para o retirar da posição e do local onde ele estava, mas com muita precaução e com medo que houvesse mais alguma mina, e que rebentasse.
Sim meus amigos, minas mandadas colocar pelo nosso Segundo Comandante Major Gaspena, um homem muito corajoso, que para se proteger do inimigo não encontrou outra solução senão armar uma ratoeira para que lá caíssem os seus subalternos, prova essa que mandou armadilhar a vedação, e devia ter avisado todo o pessoal o que não o fez; nesse local, o nosso amigo e camarada ex-Fur Mil LOUREIRO não teve sorte, porque nesse dia teve a ideia de ir dar um passeio até às tabancas, que se situavam do lado da bolanha e, como não estava ao corrente de que essa vedação se encontrava armadilhada, passou pelo local para encurtar caminho, mas, infelizmente, lá deixou uma das coisas que nós temos de mais precioso foram, como as suas pernas. Assim ficou mutilado para toda a vida, por culpa desse «Incompetente », Major corajoso ...!
Depois desta tragédia foi interrogado sobre a razão da colocação das armadilhas e da razão porque não fora avisado todo o pessoal?
Ou que respondeu que tinha agido muito bem, porque caso não o tivesse feito, o inimigo poderia vir a saber e já não passava por lá. Foi tranferido (para onde, nunca o soube) e que tinha sido condenado em vinte dias de prisão. Pouco para quem foi responsável por uma acção desta gravidade.
Para mim, foi o episódio, de todos, o mais terrível de suportar, só de pensar que fui testemunha desse «Acidente!» e que fui impotente para o evitar; mas já era este o destino do ex-Fur Mil LOUREIRO.
Há dias soube que este nosso amigo e camarada tinha falecido. Onde ele estiver, digo-lhe em pensamento «Descansa em paz, amigo LOUREIRO ...».
Quero, ainda, acrescentar que se esta minha «Trágica Estória» venha a chocar algum dos nossos leitores e camaradas, não foi esta, deveras, a minha intenção, simplesmente, recordar a sua memória, pois agora já não pertence ao reino dos vivos, e peço desculpa por isso.
Em relação a esse corajoso Major ...!, ainda tenho mais episódios para recordar e contar, mas fica para outra ocasião.
Um abraço, Francisco Pereira.
«Este episódio foi dedicado a toda uma sua família e, especialmente, em sua memória. Paz à sua Alma, ex-Fur Mil LOUREIRO »
Francisco Pereira, ex-Soldado Rec Info CCS / Bart 2857, em Piche
França
Extracto História da Unidade do Bart 2857
O moderador presenciou e foi interveniente como escrivão, desse acidente em termos de disciplina militar, não se recorda nem transportaria para esta estória as transcrições do Processo. O Francisco Pereira limita-se a transcrever o que viu, sentiu, e se disse, como é normal nessas oasiões.
Contudo, posso afirmar «que a razão da colocação da armadilha, 100 gramas de TROTIL, sob uma tábua, era unicamente para assustar!, Uma vez que o arame farpado sem se encontrava flexível sem condições de segurança, em virtude, de ser hábito da População utilizar essa passagem, mais directa para a bolanha, local onde lavavam as roupas, caso contrário teriam, de dar uma volta a mais de metade do Aquartelamento, e ficava muito longe e demorado. É, igualmente, verdade que foram avisadas unicamente as Praças, no refeitório, nos dois turnos do jantar, cujo não era no mesmo local do dos Oficiais e Sargentos, não tendo sido estes, efectivamente, avisados. A colocação da armadilha foi da autoria do Comandante do Pelotão de Sapadores ex-Alferes Sapador de Infantaria Vicente Mota, exclusivamente, por ordem e responsabilidade do Segundo Comandante ex-Major Gaspena, e temos que concordar que não existiu o mínimo de sangue frio de bom senso ... deplorável e lamentável.
Pereira da Costa, ex-Fur Mil Oper Info CCS / Bart 2857, Piche
Administrador e Moderador do Blogue «Bart 2857»
Abates ao Efectivo, CCS / Bart 2857
Major de Artilharia CARLOS ALBERTO DA SILVA CASTRO GASPENA, abatido ao efectivo, desde 02MAR70, inclusive, por lhe ter sido dada como terminada, a sua comissão de serviço na CTIG.
Punições, CCS / Bart 2857
Major de Artilharia CARLOS ALBERTO DE CASTRO SILVA GASPENA, punido com 20 dias de prisão disciplinar agravada, por SEXA GENERAL COMCHEFE, em 03FEV70
Extracto da História da Unidade do Bart 2857
Caro amigo, li e reli com atenção, historia de arrepiar! Tantas Histórias ainda estão por contar tudo o que passamos só nós é que damos valor tudo aquilo que vivemos dias que mão tinham fim. Graças as novas tecnologias que vieram para dar o conhecimento das historias verídicas que passamos. Um abraço deste amigo. António J.P.Costa
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